Não nasci a gostar de touradas; foi um gosto adquirido, por motivos que poderei explicar a quem o mereça. Não gosto de caçar, mas respeito os caçadores. Não gosto de futebol, mas não me importo que, à segunda-feira, não se consiga falar de outra coisa. Em suma, respeito toda a gente que tenha gostos e opiniões diferentes da minha, desde que sustentados.
É o que se passa com
R.L., com quem iniciei há algum tempo uma saudável discussão noutro
blog, e que agora me vem acusar, no seu próprio blog, de me ter sentido "cansado" dessa mesma discussão.
Mea culpa! Senti-me cansado, sim, porque percebi rapidamente que a discussão não iria ser profícua, dado o total antagonismo de posições, e também porque, confesso, luto sempre por aquilo em que acredito, mas tenho pouca capacidade de "evangelização" quando tento convencer o meu próximo da bondade das minhas causas.
Mas, voltando um pouco atrás, há que perceber o que vai na alma de um
aficcionado (e atenção, que não estou a falar da "feira de vaidades" do Campo Pequeno, mas da verdadeira
fiesta nos
pueblos, em Espanha). A luta é desigual? Sê-lo-á, porventura, mas resta saber quem é o mais forte nessa luta; se o toureiro, apetrechado apenas com um pano e a sua inteligência, ou o touro, com 500 quilos de força bruta capazes de matar um homem em segundos.
E muitas vezes o homem tem perdido!
A alegada falta de coerência entre dizer que se gosta do um touro, e depois vê-lo morrer na arena, apenas pode ser sentida - nunca explicada. No entanto, é evidente que ninguém pensa em adoptar o touro como bichinho de estimação. "Gostar de um touro" significa considerar que aquele é um animal nobre, eventualmente de belo porte, criado exclusivamente para a luta da sua vida, ao fim de quatro ou cinco anos de vida livre na lezíria (peço perdão a R.L., mas não discutirei aqui a hipótese por si aventada de o touro, por só conviver com machos, poder desenvolver comportamentos homossexuais).
E não se pense que o touro perde sempre essa luta! Ainda que não sejam frequentes, são diversos os casos em que, atendendo à bravura do animal, a sua vida é poupada para que sirva de semental da raça.
Vejamos agora os argumentos dos detractores das touradas; o mais recorrente equipara os touros a seres humanos, alegando, por exemplo que, se se permitem touradas, também se deveriam voltar a enviar cristãos aos leões, ou outros dislates do género. Ora, é para mim líquido que, enquanto existirem seres humanos com verdadeiras necessidades, todo e qualquer pensamento de privilégio para com animais irracionais (é assim, pelo menos, que a ciência os define), soa a pura hipocrisia.
Como hipocrisia poderá também parecer que estas pessoas, depois de se manifestarem, com evidente falta de respeito para com quem gosta de touradas, se sentem à mesa a comer animais criados e abatidos sabe-se lá em que condições (que me perdoe R.L., que se afirma vegetariano, mas acredite que há muitos dos seus correligionários que se deliciam com uma bela costeleta de novilho).
Como também não me explicam porque não fazem expedições pela província, impedindo a festa da matança do porco, o abate de coelhos com uma pancada na cabeça, a decapitação das galinhas, o afogamento de gatos ou cães recém nascidos, ou, mais prosaicamente, a ida para a panela de caracóis vivos. São todas formas de infligir sofrimento aos animais, não são? Ou será que os fins justificam os meios?
Mas não; as touradas são o seu alvo preferido, por ser o mais fácil. Caro R.L., e restantes leitores: não sou sádico, mas gosto de ver tourada. Não sofrerão mais que o touro, o burro ou o cavalo que, usando a vossa deliciosa equiparação à raça humana, vivem vidas de autêntica escravidão e trabalho para além dos limites?
Não vos peço que gostem de touradas, nem tampouco que as vejam; a única coisa razoável que peço é que respeitem quem gosta, ou então sejam coerentes e tentem, em primeiro lugar, impedir os massacres de seres humanos por esse mundo fora!