2004/09/17

Poema...



...humildemente dedicado a toda a gente que se entretém a combater a caça à raposa em Inglaterra (que a mim tanto se me dá como se me deu...), bem como as toiradas, de que gosto muito, e que "esquece" outros actos bem mais cruéis, muitas vezes perpetrados contra seres humanos (mas lá longe...):

As pessoas sensíveis não são capazes
De matar galinhas
Porém são capazes
De comer galinhas
(...)

Sophia de Mello Breyner Andresen in "Livro Sexto", 1962

2004/09/16

Sumólico

O Lourenço por vezes é muito barulhento, mas pareceu-me que ontem, no noticiário da hora de almoço, para além de ver João Soares atirar displicentemente a ponta de um cigarro para o chão do Largo do Rato, ouvi nitidamente um bigodudo director do Benfica falar na opinião de supersumos.

Falsa partida

Há muito que não me sucedia ter um dia assim; nunca chegaram à noite com a sensação de terem sido uma espécie de observadores exteriores da vossa vida?

Eu sei que num post deste tipo a exposição pessoal atinge níveis perto do limite, mas também, se me importasse demasiado com isso, para que criaria um blog?

A verdade é que ontem, último dia de férias, quase ansiava pelo regresso ao trabalho e à rotina diária; mas agora, dez horas da noite, sinto que algo me escapou durante o dia. No trabalho as coisas não correram bem como esperava, nas minhas conversas senti-me como se fosse outra pessoa a falar, como se não mandasse na minha vontade (e, se calhar, perdi de novo a oportunidade de dizer coisas importantes), e, neste suposto primeiro dia de uma nova dieta, fui jantar a casa da minha mãe onde, como qualquer pessoa sabe, é impossível fazer dieta!

Para cúmulo sinto-me febril, indisposto, e amanhã cedinho tenho que fazer uma viagem grande - trabalho outra vez. Bom, chega de intimidades, vou dormir.

Ganda Vitórria, carraças!

Não sou grande apreciador de futebol, já o disse aqui várias vezes, e por mim o Campeonato até podia acabar já hoje.

2004/09/15

Caso não tenham reparado:

Estou de volta - já cheio de saudades de tudo o que lá deixei: dos pequenos almoços na esplanada do Fresco, e dos Villiger fumados à noite, no terraço, a ouvir o marulhar das ondas (num caso e noutro com o frio do Atlântico na cara) - cheio de saudades de tanta coisa, é verdade, mas de volta.

O povo, esse ignorante...

Tenho acompanhado, como toda a gente, a manobra de propaganda pura que meia dúzia de holandesas vieram fazer para a costa portuguesa, dando boleia a outra meia dúzia de portugueses, certamente amigos de Francisco Louçã e sequiosos de auto-promoção.

Não me parece, no entanto, que tenha sido dos melhores serviços prestados a uma causa, já de si dificilmete defensável, esta espécie de circo montado nas barbas dos portugueses. Mas muita gente viu aqui a nesga de oportunidade para - novamente - subverter a democracia vigente e tentar pela enésima vez a alteração da lei do aborto, fazendo tábua rasa de um referendo cujo resultado não foi o por si esperado.

Reclamam alegadamente, estes artistas improvisados, o direito da mulher grávida a mandar no seu corpo; esquecem, convenientemente, que no caso de uma mulher grávida existe uma outra vida dentro do seu corpo, e não um qualquer tumor a extirpar ou vírus a erradicar - uma vida, aliás, absolutamente indefesa, e apenas dependente da mãe para sobreviver.

Mas uma vida ceifada não passa de fait-divers para quem apenas ambiciona a sua própria progressão política, seja a que custo for. Afirmam estes supostos defensores dos direitos da mãe - mas não, curiosamente, dos direitos do pai ou do filho - para supostamente alicerçarem a sua patética argumentação a favor da morte de inocentes, que entre os opositores à liberalização do aborto existe muita "tia" que já foi, ou há-de ir, a Badajoz efectuar um oportuno "desmancho". Como se o facto de haver um bombeiro que deita fogo a uma serra fizesse de todos os bombeiros incendiários!

Mas a mais curiosa afirmação de quem só pensa em afirmar a sua opinião, nem que tenha que cilindrar todas as outras, ouvi-a há uns dias de João Soares, nesta sua patusca campanha para a liderança do PS: pelos vistos, o filho de um dos "maiores democratas portugueses" (eles é que dizem...) sempre afirmou que "o referendo era um logro" e que a questão do aborto devia ser discutida sem extravazar os limites da Assembleia da República. O professor de Santa Comba Dão não teria dito melhor. E, acrescento eu, também deve ser uma real chatice que seja todo o povo a votar, não é? Gentinha sem qualquer tipo de cultura política. Deve ser uma pena que as eleições não possam ser apenas decididas nas redacções dos jornais, de preferência de acordo com as sondagens, ou por quem faz aquelas setinhas do "sobe e desce".

O melhor espectáculo do mundo!

Por estes dias (e não há tão poucos como isso) temos sido bombardeados com as mais diversas loas ao concerto de Madonna. Começou por ser um movimento ténue, a propósito da possibilidade de o dito concerto ter que ser cancelado, devido ao agendamento anterior para a mesma data de um congresso da Igreja Maná - o que, vendo bem, até faz sentido, pois trata-se de acontecimentos com graus de importância equivalentes - mas rapidamente se alargou a toda a classe pensante, com a blogosfera também ela rendida à virgem.

No entanto, a profusão de reportagens nestes últimos dias - aliada ao facto de eu ter estado de férias, sem acesso à net, e com (demasiado) acesso à televisão - tornou-se verdadeiramente insuportável. Ontem à noite era ver as entrevistas com quem saía do Pavilhão Atlântico, e a ladaínha era sempre a mesma: entre muita baba, meninas muito loiras e meninos muito bronzeados diziam a uma voz "foi o melhor espectáculo que já vi", "inesquecível", "patati", "patatá" - e isto, note-se, a propósito de um concerto "de plástico", milimetricamente coreografado e planeado para fazer delirar as hostes.

O que se torna aqui verdadeiramente fascinante é verificar até que ponto os media influenciam o homem comum; vendo aquelas almas tão genuinamente saciadas com um bocado de concerto "a metro", quase somos levados a pensar que fizémos mal em não ter ido esperar umas horas para uma fila, a fim de ver a - so called - diva.

Mas depois pensamos melhor; se as televisões tivessem estado em peso uns dias antes à saída do Paradise Garage, onde decorreu, muito provavelmente, um dos últimos espectáculos dos The Libertines, não teria ouvido comentários semelhantes, ainda que de gente diferente?

E se tivessem estado há umas semanas à saída da muralha de Óbidos, depois do concerto de Lloyd Cole, debaixo de uma magnífica lua cheia, ter-me-iam certamente ouvido dizer que poucos momentos na minha vida me deram a mesma satisfação daquelas duas horas. Mas a televisão real vai para a porta do concerto da Madonna e não para Óbidos - e ainda bem que assim é!