2005/07/04

Indignação

Sanguinário, sensacionalista, abjecto, ignorante, manipulador, são apenas alguns dos muitos adjectivos que se me afigurariam justos para qualificar a abertura do noticiário das 20 horas, ontem, na SIC (aliás, soube a posteriori que as outras estações de televisão também pautaram as suas intervenções pela mesma bitola). Com efeito, parece-me no mínimo indecente que uma estação de televisão, para a qual o automobilismo não existe quando não há acidentes, e em que "desporto" apenas rima com "futebol", venha apresentar como abertura de um jornal em horário nobre um acidente de viação, com a particularidade de ter envolvido uma viatura que participava num rali, ainda que tenha acontecido num sector de ligação, e evidenciando um desconhecimento de causa aterrador, mesmo depois de terem sido ministradas aos jornalistas algumas noções base do funcionamento de um rali - mas, evidentemente, e tal como nos tablóides, a informação rigorosa pouco interessa quando temos a hipótese de ganhar share à custa de desinformação maliciosa e intencionalmente pervertida. E, neste caso, o propósito único do jornalista (faz-me algumas comichões referir-me a quem produz uma peça daquelas como "jornalista") não é outro senão o de tentar mostrar à opinião pública que os pilotos de automóveis são seres destituídos de consciência, equiparáveis a street racers (gente que qualquer participante em corridas regulamentadas detesta), capazes de passar a vida a acelerar na via pública, levando à frente tudo o que lhes apareça pelo caminho.

Neste momento de dor, quero deixar os meus sentidos pêsames à família açoriana envolvida no desastre de sexta passada, mas, por uma questão de coerência - palavra que certamente não faz parte do léxico da SIC - esses mesmos pêsames deverão ser extensivos aos milhares de famílias que perderam já entes queridos em acidentes rodoviários, mas que a SIC não noticiou porque não aconteceram com um carro de ralis e, portanto, não davam audiências.

Quero também deixar um forte abraço de solidariedade e ânimo ao Ricardo Teodósio e ao Paulo Primaz, e desejar-lhes toda a força para que possam estar de regresso aos ralis, onde fazem tanta falta, o mais rapidamente possível.