Já aqui disse uma vez que gosto de quartos de hotel por serem assépticos e impessoais, e digo agora que, pelas mesmas razões, detesto casas assim. Gosto de entrar numa casa e, mesmo sem saber nada sobre os seus proprietários, poder fazer um retrato aproximativo deles. Gosto de bisbilhotar os livros que lêem, os CDs que ouvem, os videos ou DVDs que têm - isto, naturalmente, quando têm algumas destas coisas, o que nem sempre é verdade.
Há casas deprimentes; são aquelas em que entramos, e as coisas estão exactamente no sítio em que deveriam estar, a higiene é irrepreensível, e em que tudo combina com tudo (e nada combina com nada). São casas sem personalidade, que poderiam muito bem passar por um apartamento mobilado, algures num aldeamento da moda, no Algarve.
Alguns acusar-me-ão de despeito, por saberem que, com uma cadela e um filho de dois anos em casa, será difícil mantê-la primorosa - é um facto, mas a verdade é que este tipo de pensamento não me vem de agora. Sempre pensei assim, primeiro inconscientemente, e depois assumidamente, a partir da altura em que li um magnífico texto de Manuel Graça Dias (possivelmente o melhor arquitecto português - e sei do que falo) em que se referia jocosamente às pessoas que lhe pediam aquilo que ele designava por "decoração instantânea"; aquelas pessoas que, para combinar com o seu espremedor Phillipe Starck, gastam 20.000 euros para comprar toda uma mobília do mesmo designer!
P.S.: O texto em apreço foi inicialmente publicado numa crónica d'"O Independente", chamada "Vida Moderna", e mais tarde, em 1992, fez parte de uma compilação com o mesmo título, editada por João Azevedo.
2003/10/06
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