2003/09/28

A massa cinzenta

Há, em Portugal, uma grande "massa cinzenta". Não, não me refiro à quantidade de neurónios, nem isto é uma alusão velada a Pacheco Pereira, que por certo mereceria uma resposta melhor elaborada à sua carta aberta a António Lobo Xavier, publicada há uns dias no "Público" - se J.P.P. se pode, petulantemente, arrogar em destinatário de um excelente artigo de opinião de A.L.X., obviamente não endereçado, por que razão não me poderei eu assumir co-destinatário da supra citada "carta aberta"?

Mas este tema ficará para próxima oportunidade, já que me estou a desviar do assunto sobre o qual queria escrever. A "massa cinzenta" a que me refiro, é constituída por muitos milhares de pessoas, que se caracterizam por não terem gosto próprio - ou melhor, partilham todos o mesmo gosto, o "gosto politicamente correcto".

Todos os legionários da "massa cinzenta" sabem que, se não souberem discutir à Segunda-feira os lances dos jogos de futebol da véspera, estarão condenados a traumatizantes ostracismos. Sabem também que, se não tiverem no seu curriculum uma visita de um dia à Expo'98, de preferência fazendo parte do milhão de almas que partilharam o espaço na última noite, serão violentamente desprezados. Lutam e esgatanham-se para encontrarem "o seu lugar ao sol" (literalmente), no Verão, em Vilamoura, sabendo que só isso lhes poderá dar algum statu. E, ouvindo dizer que vêm cá os Rolling Stones, estão dispostos a vender a mãe para conseguir um bilhete!

Claro que, na maior parte das vezes, pouco ou nenhum proveito tiram dos factos; duvido que mais de metade dos "enlatados" que estiveram no recinto da Expo'98 na ocasião que refiro acima, não estivessem a pensar na asneira que haviam cometido - ou que muitas das pessoas que se acotovelaram a noite passada, em Coimbra, para (tentar) ver alguns sexagenários aos pulos tivessem: a) um conhecimento razoável do reportório do grupo, b) assisitido ao concerto em condições (físicas e psicológicas) minimamente dignas. Mas "que se lixe"! Como diz o meu amigo H.P., bom conhecedor e analista de personalidades, estiveram lá, e isso é que "dá pontos"!

Nem uma referência ouvi aos Primal Scream que, com os nossos Xutos & Pontapés, abriram o espectáculo; e, no entanto, deve ter sido a melhor performance da noite!

Músicas dos Rollings Stones ouviam-se nos anos 70; agora cheira tudo a requentado. Mas, para os saudosistas, recomendo o excelente álbum "Lipstick traces", dos Manic Street Preachers; é duplo, e o segundo CD é só (penso) dedicado a covers. Lá poderão encontrar uma fantástica versão de "Out of time", dos Stones, mas também belas interpretações de "Can't take my eyes off you" ou "Raindrops keep falling on my head" (não sei quem interpretava originalmente estas duas, mas sei que a segunda foi escrita pelo rei do pop-kitsch - expressão minha - Burt Bacharach), ou ainda as recriações soberbas de "Train in vain", dos The Clash, e "Last Christmas", dos... Wham!

Aposto o que quiserem, que ninguém é capaz de ouvir este CD, e não andar depois a cantarolar estas canções!

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