2005/10/15

Romance

Rob Flemming, o protagonista do excelente "High Fidelity", de Nick Hornby, desmonta, a certa altura do seu relato na primeira pessoa, o mito de que há músicas que parecem ter sido escritas especial e exclusivamente para o nosso estado de espírito de cada momento. Diz ele que, seja qual for a nossa disposição, é facílimo encontrar uma música que se adapte a ela - ou, melhor dizendo, cuja letra se encaixe na perfeição, de tal forma que nos parece que só poderia ter sido escrita para nós. Só que, continuando a tese, essa música também se adapta a, pelos menos, um milhão de almas - e isto é especialmente válido para os apaixonados, como é óbvio e sabido.

Mas, mesmo sabendo de antemão tudo isto, custa-me a crer que M. Kretzmer não estivesse a pensar em mim, e em como eu me estaria a sentir agora, quando há mais de trinta anos escreveu, para Charles Aznavour cantar, isto:

She may be the face I can't forget
A trace of pleasure or regret
May be my treasure or the price I have to pay
She may be the song that summer sings
May be the children autumn brings
May be a hundred different things
Within the measure of a day

She may be the beauty or the beast
May be the famine or the feast
May turn each day into a Heaven or a Hell
She may be the mirror of my dream
A smile reflected in a stream
She may not be what she may seem
Inside her shell

She, who always seems so happy in a crowd
Whose eyes can be so private and so proud
No one's allowed to see them when they cry
She may be the love that cannot hope to last
May come to leap from shadows of the past
That I'll remember 'till the day I die

She may be the reason I survive
The why and wherefore I'm alive
The one I'll care for through the rough and ready years

Me, I'll take the laughter and her tears
And make them all my souvenirs
For where she goes I've got to be
The meaning of my life is
She, She
Oh, She

2005/10/12

Chuva


Hoje vou-me deitar mais cedo.

Photomaton


Mondariz, Galiza, Rali de Invierno, Janeiro de 2005.

2005/10/11

Manhã amarela

O Lourenço (4 anos, para quem não sabe) dormiu cá esta noite. De manhã dou-lhe banho em estilo greco-romano, visto-o e digo-lhe para ir para o piso de baixo ver desenhos animados, enquanto eu despacho as minhas próprias abluções matinais. Quando desço, pronto para sairmos, noto umas estranhas manchas amarelas, já algo desbotadas, no chão da sala.

- Lourenço, o que é isto, filho?

Depois de inspeccionar cuidadosamente a mancha, como se nunca a tivesse visto mais gorda, lá diz meio a medo:

- Fui eu que estava a fazer uma pintura...
- Aqui, no chão?
- Não, aqui neste papel.

Dirige-se para o outro lado da sala e apanha do chão uma folha A4 a pingar uma espécie de pasta amarela para o tapete.

- Não, filho, não mexas nisso. Cuidado, está a pingar!

Tiro-lhe num repente a folha das mãos, viro-a para cima e finjo examiná-la, enquanto ele me olha algo desiludido. Com remorsos, resolvo desagravar:

- Hmm, está muito bonito; como é que fizeste?

E ele muito contente, dirigindo-se para trás do sofá e reaparecendo a sacudir uma espécie de marcador que deitava a tal pasta amarela pela ponta em golfadas:

- Foi com esta caneta, pai; agora só temos que deixar secar!
- Que caneta é essa? Dá cá isso, filho!

Levo a caneta, ou lá que raio é aquilo, rapidamente para a cozinha, não conseguindo, contudo, evitar mais uns pingos nos mosaicos e no balcão. De volta à sala, pergunto-lhe:

- Mas olha lá, ainda não me disseste como é que apareceram aquelas manchas ali do outro lado da sala...

Ele hesita, mas lá explica:

- É que eu pus o desenho no chão para secar, mas depois estava a olhar para a televisão e pus um pé em cima, e fui à casa de banho lavar o ténis. Olha!

Mostra-me a sola do sapato, que realmente está amarela, assim como o caminho até à casa de banho. E depois continua:

- Mas eu limpei o chão!
- Limpaste o chão? Com quê?
- Com isto!

E, triunfante, mostra-me uma esponja de engraxar sapatos toda manchada de amarelo.

Desce o pano, entre gargalhadas e mimos.

Serviço público


Não sei se isto é jazz, se é rock'n'roll, se o tipo é um crooner (ena, tantos anglicismos em tão poucas palavras!), mas lá que é muito bom, isso é!

Sonhos

Um dos maiores dramas de quem sofre desilusões é que depois tornamo-nos cépticos - e, quando algo parece estar a acontecer exactamente como gostaríamos que acontecesse, nós simplesmente não acreditamos que seja verdade. Talvez fosse mais fácil não sonhar, e esperar apenas, mas será alguém capaz de tal?

E agora, um pouco de ar puro:


Esquece lá essa história de irmos a Búzios e ao Rio; porque é que não vamos antes aqui enfeirar, como tu dizes, já em Janeiro?

2005/10/10

2,99%!

Se fosse para termos tido um resultado decente, preferiria que não tivesse sido assim, mas o meu orgulho palerma obriga-me a informar que a lista por mim encabeçada nestas desgraçadas eleições, concorrente pelo CDS-PP à Junta de Freguesia de São Lourenço de Azeitão, obteve a mais alta percentagem de votação de entre todas as listas concorrentes pelo meu partido a todos os órgãos autárquicos do concelho. Mais: em todo o distrito, e em todas as muitas dezenas de organismos a que o CDS-PP concorreu sozinho, a "minha" lista teve, sempre em termos percentuais, a terceira melhor votação. É obra, num cenário como o deste triste reduto vermelho.

Obrigado, pois, a todos os meus queridos amigos azeitonenses que acreditaram no meu partido de há mais de vinte anos e em mim; daqui a quatro anos prometo-vos que as coisas serão muito diferentes!

O último reduto

Lord Byron escreveu, há uns dois séculos atrás, sobre as belezas naturais e arquitectónicas de Sintra por oposição à barbárie e fealdade do povo que lá morava que, na sua aristocrática opinião, não era merecedor de tão belo lugar.

Neste momento parece-me que tudo o que o inglês disse em Sintra pode ser aplicado, quase ipsis verbis, a Setúbal - substituindo apenas a "barbárie e fealdade" por "incultura política e fanatismo". Que vergonha...